Ads 468x60px

.

Aprovado o Ato Institucional nº 1 – Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014 – A Constituição da Internet no Brasil


Em 1964 com o advento do Ato Institucional nº 1, AI-1, foi mantida a Constituição então vigente (art.1º) com as alterações trazidas pelo referido Ato Institucional, similar ao ocorrido com o atual AI-1, ou Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, que dita os princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.


O AI-1 de 1964 previa prazos céleres para análise de projetos de lei do Governo, que, se excedidos, esses projetos estariam automaticamente aprovados (art. 4º). Não tem sido muito diferente, no contexto atual, com o já julgado mensalão, prática pela qual os projetos deviam ser aprovados mediante a venda e compra de votos de parlamentares.

A Lei 12.965/2014 teve sua aprovação num estalo de dedos no Senado Federal, isso revelado pela aprovação em duas comissões e pelo plenário no mesmo dia, algo totalmente incomum naquela Casa Legislativa, onde tudo fica tramita por anos. Inclusive, para propiciar a rápida aprovação, ocorreu uma polêmica inversão de pauta de votação, possibilitando sua aprovação sem debates, como realçado por senadores de oposição.

O AI-1 de 1964 em seu art. 8º tem a seguinte redação: - Os inquéritos e processos visando à apuração da responsabilidade pela prática de crime contra o Estado ou seu patrimônio e a ordem política e social ou de atos de guerra revolucionária poderão ser instaurados individual ou coletivamente.

A atual Lei 12.965/2014 contém uma norma constante nos §§3º e 4º que, dependendo da interpretação, pode ser benéfica ou maléfica. Se interpretada maleficamente poderá ter o mesmo poder de opressão do o art.8º do AI nº 1 de 1964. Vejamos:

§ 3o As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.

§ 4o O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3o, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Não duvido que políticos e gestores públicos denunciados e criticados em razão do modo de conduzir as questões do país se utilizem dessas disposições para invocar uma célere ordem judicial para excluir conteúdos que manchem suas reputações, como aqueles escândalos de enormes rombos envolvendo o patrimônio da PETROBRÁS.

Também podem ser censuradas por tais normas sites ou páginas onde conste conteúdos contra o aborto, moralistas, religiosos tradicionais, politicamente incorretos, sob a falsa justificativa de afronta à “coletividade”, quando em realidade afronta apenas os interesses que o Estado, como AGENTE CONDICIONANTE, tenta maliciosamente apagar ou valores que quer IMPOR à sociedade. Não se trata de democracia!

O receio encontra respaldo na possibilidade de qualquer juiz, de qualquer foro cível brasileiro ser competente (poder decidir), diferente da regra normal de existir um juiz natural (de um lugar apenas), contornando a impossibilidade de escolha do juiz que irá julgar.

Esse juiz escolhido poderá deferir uma ordem considerando existir o interesse da coletividade na disponibilização (ou na não disponibilização) de um determinado conteúdo postado na internet. Parece algo equiparável ao antigo censor.

Esse fenômeno pode conduzir à censura de ideias e opiniões, prejudicando o direito à informação e liberdade de expressão de todos os brasileiros em face de algo que apenas afeta a imagem de um político corrupto ou dificulta o Estado fazer prevalecer suas vontades condicionantes da sociedade, normalmente rotuladas na mídia como politicamente corretas.

Uma vez que a doutrinação injusta é amparada pela rotulação politicamente correta, resta bem fácil visualizar o “interesse da coletividade” numa decisão, possibilitando a antecipação da tutela para combater tudo que vai contra esse valor.

Entretanto, o interesse é apenas do Governo ou do Estado, como agente condicionante, mas com o rótulo propagandístico qualificando-o como politicamente correto. A sociedade é vítima por não ter acesso à informação, enquanto o censurado é vítima de um processo judicial amparado por uma norma ditatorial.

Diferenças entre o AI-1 de 1964 e o atual, constante na Lei 12.965/2014, também existem. Um decorreu da direita, outro da esquerda. Aquele sob a justificativa do perigo da invasão americana e da guerrilha comunista; este justificado apenas em argumentos propagandísticos. O primeiro jogava todos os poderes para o Executivo, a atual joga para o Judiciário.

Na literatura jurídica, a tirania é criticada ainda mais quando exercida pelo Poder Jurisdicional, eis que esse seria o freio e contrapeso; sem este, não há freio ou contrapeso, não há controle do Estado.

Acredito que o atual Poder Judiciário terá discernimento e cuidado para utilizar de modo democrático e benévolo o poder contido nessa lei sem limites, entretanto não há garantia de segurança no futuro, explica-se.

Primeiramente, existe o perigo em razão da Lei 12.965/2014 não ser autossuficiente, possibilitando ao Governo Federal regulamentar a GOVERNANÇA NA INTERNET por meio de Decreto (O quê é Governança? Até onde isso vai?). Em outras palavras, normas novas podem surgir por meio de um ato institucional governamental baixado por Decreto, ao critério exclusivo da Presidência da República.

Outro temor é que, nas cortes superiores, os julgadores (ministros) são NOMEADOS livremente pelo Presidente da República, o qual pode nomear pessoas com opiniões previamente conhecidas, partidárias e até afinadas com seus decretos, mais uma vez neutralizando os freios e contrapesos.

Enfraquecendo ou exterminando a atividade de controle jurisdicional tem a PEC 33, ora em trâmite. Ela pretende criar normas constitucionais para rechaçar a possibilidade do STF declarar a inconstitucionalidade de leis ou de tais Decretos.

A PEC 33 tolhe o poder jurisdicional de controle pelo Judiciário/Supremo Tribunal Federal. Poderemos chamar tal PEC, se aprovada, de Ato Institucional nº 2.

Sabemos que, em regimes totalitários prevalece essa prática. Contudo, nesse momento, ainda acredito no Judiciário brasileiro.

Também acredito que essa Lei 12.965/2014, sozinha, sem uma alteração na atual composição do STF (com nomeações de partidários) não será capaz de colocar a censura no Brasil, embora possa ser o primeiro passo (AI-1).

Estou seguro que os Brasileiros devem lutar mais pela boa interpretação dessas normas que simplesmente abominá-las de braços cruzados.

Outros erros existem nessa lei, como a exigência de formação de registro histórico de acessos em sites e páginas. Considero um absurdo.

Seria o mesmo que colocar um GPS 24 horas por dia, 7 dias por semana, pelo resto da vida, no cidadão contra a sua vontade, visando mapear cada rua que ele transita, cada local que ele entra, quando entra, aquilo que ele conhece, quem ele visita.

Depois dessa invasão de privacidade e arquivamento de tudo que cidadão fez na internet, para “tranquilizá-lo” a norma revela que tudo só será revelado mediante ordem judicial.

É o que faz esse Ato Institucional, Lei 12.965/2014, com o trânsito individual de cada pessoa na internet:

Da Guarda de Registros de Acesso a Aplicações de Internet na Provisão de Aplicações

Art. 15.  O provedor de aplicações de internet constituído na forma de pessoa jurídica e que exerça essa atividade de forma organizada, profissionalmente e com fins econômicos deverá manter os respectivos registros de acesso a aplicações de internet, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de 6 (seis) meses, nos termos do regulamento.

§ 1o Ordem judicial poderá obrigar, por tempo certo, os provedores de aplicações de internet que não estão sujeitos ao disposto no caput a guardarem registros de acesso a aplicações de internet, desde que se trate de registros relativos a fatos específicos em período determinado.

§ 2o A autoridade policial ou administrativa ou o Ministério Público poderão requerer cautelarmente a qualquer provedor de aplicações de internet que os registros de acesso a aplicações de internet sejam guardados, inclusive por prazo superior ao previsto no caput, observado o disposto nos §§ 3o e 4o do art. 13.

§ 3o Em qualquer hipótese, a disponibilização ao requerente dos registros de que trata este artigo deverá ser precedida de autorização judicial, conforme disposto na Seção IV deste Capítulo.

§ 4o Na aplicação de sanções pelo descumprimento ao disposto neste artigo, serão considerados a natureza e a gravidade da infração, os danos dela resultantes, eventual vantagem auferida pelo infrator, as circunstâncias agravantes, os antecedentes do infrator e a reincidência.

A Constituição afirma que todos são presumidos bons e corretos (inocentes) até prova em contrário.

O que esse controle de acesso fez foi transformar todos nós, brasileiros bons e corretos, em evidentes suspeitos de tudo, abstratamente; afrontando a própria Constituição.

Considerando a essência, é institucional aquilo que decorre das instituições. Até a nomenclatura possibilita tachar de Ato Institucional a Lei 12.965/2014.

Depois de demonstrar OBJETIVAMENTE que a Lei 12.965/2014 é em grande parte equiparável ao malévolo Ato Institucional nº 1, de 1964, aparenta importante registrar o que existe de bom nessa lei.

Existem pontos positivos nessa lei? Sim.

Como exemplo de boas normas constantes nessa lei, podem ser citadas:

Art. 18.  O provedor de conexão à internet não será responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros.

Art. 19.  Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

§ 1o A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.

§ 2o A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5o da Constituição Federal.

Outro conteúdo bom dessa lei é o sigilo constante no art.23:

Art. 23.  Cabe ao juiz tomar as providências necessárias à garantia do sigilo das informações recebidas e à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem do usuário, podendo determinar segredo de justiça, inclusive quanto aos pedidos de guarda de registro.

Finalizo as críticas e elogios, com a certeza que uma lei com normas boas não tem justificada as tiranias que desnecessariamente possibilita.

Aliás, o governo não perde tempo quando tem uma chance concreta de censurar, como evidenciou para todo o Brasil a recente censura imposta por meio de ameaça de corte de patrocínios institucionais, cerceando os comentários no telejornal do SBT e em face da jornalista Rachel Sheherazade.

Os direitos resguardados nessa lei apelidada de Constituição da Internet poderiam ser protegidos sem trazer conjuntamente essas aberrações mencionadas.

Nada justifica a censura ou o controle social.  

MDI


____________